quinta-feira, 16 de agosto de 2007

Certa forma de ver




“Se eu morrer, morre comigo uma certa forma de ver.”
Carlos Drummond de Andrade



Ao mesmo tempo, penso, que se eu ‘viver’, vive comigo uma certa forma de ver.


Se eu viver a vida que me faz sentido – o que é dado por uma certa forma de ver – é possível que esteja a viver. Se viver a vida sem perceber qual seu sentido, porém, não deixa de ser por conta de uma certa forma de ver.


E se eu viver a vida com um sentido ‘emprestado’ de alguém a quem amo, a quem respeito, a quem admiro, passa a ser esta então a minha certa forma de ver?
Ilustração de Baptistão,
publicada no Estadão de 19/08/07

E se este sentido não for ‘emprestado’, mas imposto, qual, onde se mostra, a linha que separa e/ou transforma a minha certa forma de ver?


E como se conforma a minha certa forma de ver? Quantas certas formas de ver foram e são necessárias para configurar a minha? Quais e por que certas formas de ver configuradas eliminam, descartam outras que já assim estavam e – por outra – sugerem a revisitação, a reformulação?


Da mesma forma, com a mesma intensidade, assumo minha responsabilidade pelas certas formas de ver que procurei influenciar, mudar mesmo. Se consegui, não sei ao certo. Mas a pergunta é: poderia, deveria, é inevitável?


A minha certa forma de ver agora – que poderá ser diferente daqui a pouco – mostra que é inexorável, a deliciosa aleatoriedade e inevitabilidade da convivência humana!


A minha certa forma de ver mostra, ainda, que para esta convivência ser mesmo salutar é preciso estar atento, à espreita; e, sobretudo, é papel daqueles que já descobriram, revelar a tendência ‘imprintada’ à dominação através de uma certa forma de ver, para que outras certas formas de ver possam despertar e aguçar sua atenção e se colocar à espreita.


Elisabete Santana


Veja também "Os operadores cognitivos do pensamento complexo", de Humberto Mariotti. Clique aqui.

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